agosto 25, 2009

Ministério Público de São Paulo apura se publicidade nos gibis de Mauricio de Sousa é prejudicial às crianças

Mirella D’Elia

Criador e autor da Turma da Mônica, Mauricio de Sousa terá de prestar esclarecimentos ao Ministério Público paulista e pode ser obrigado a retirar a publicidade de seus gibis

Uma investigação do Ministério Público (MP) de São Paulo que tem como alvo os conhecidos gibis da Turma da Mônica chamou a atenção da sociedade sobre a publicidade voltada para o público infantil. O inquérito civil apura se houve abuso nas revistas por causa de anúncios dirigidos às crianças, que foram divulgados entre as historinhas de personagens como Cascão, Cebolinha, Magali e Chico Bento, além da própria Mônica. A assessoria de Mauricio de Sousa(1) informou ao Correio que ele prefere, por enquanto, não comentar o caso. O desenhista terá que prestar esclarecimentos ao MP, que poderá mandar retirar a publicidade dos gibis.

Autor da representação que resultou na abertura do inquérito, o Instituto Alana — organização sem fins lucrativos que desenvolve atividades voltadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente — critica os anúncios de produtos infantis que foram divulgados. A coordenadora-geral do projeto Criança e Consumo da entidade, Isabella Henriques, diz que meninos e meninas não conseguem saber a diferença entre o que é publicidade e o que é entretenimento. Por isso, acabam sofrendo uma influência direta da publicidade em sua formação. “Só a partir dos 12 anos é que a criança vai entender o caráter persuasivo da publicidade. Você está estimulando o consumo excessivo e traz valores materialistas. O que parece muito inocente é prejudicial para as crianças”, afirma a advogada.

O Conselho Federal de Psicologia enviou um parecer ao MP concordando com a opinião do instituto. “O pequeno leitor está literalmente cerceado de Mônicas, Cebolinhas e Cascões, seja para divertir, seja para desejar produtos variados, misturando-se ambos os aspectos da questão. Cabe a pergunta: para que tantas propagandas relacionadas às personagens, uma vez que o objetivo primeiro da revista deveria ser o divertir e fazer ler”, cita o professor da Universidade de São Paulo (USP) Yves De La Taille, que assina o texto.

Abusos
O Instituto Alana recebe, diariamente, dezenas de denúncias sobre possíveis abusos na publicidade infantil. Isabella cita uma propaganda, retirada do ar recentemente, que mostrava crianças brincando com um botijão de gás. “Há excessos. No Brasil, vendem-se até carros para crianças. A propaganda influencia em até 80% das compras da família, é uma verdadeira promotora de vendas”, explica a advogada. Ela explica que há vários dispositivos legais que proíbem a propaganda voltada para as crianças (leia O que diz a lei). “A lei existe, resta cumprir. É mais fácil vender para uma criança”, completa Isabella.

O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), órgão do Ministério da Justiça, também está atento às consequências da publicidade na formação e na saúde das crianças. Um dos principais focos de preocupação é a propaganda de alimentos, que causa reflexos no crescimento da obesidade infantil no país. Atualmente, o DPDC e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estudam baixar normas mais rígidas para o setor. O Ministério da Justiça informou que pretende ampliar os estudos para outras áreas.

1- Como tudo começou
Mauricio de Sousa começou a carreira em 1959. A primeira tira, publicada no jornal Folha da Manhã (hoje Folha de S. Paulo), mostrava um cachorrinho e o dono dele — depois batizados de Bidu e Franjinha. Em 50 anos de carreira, suas criações saíram dos gibis e chegaram às telas de cinema e TV, jogos e internet. Um império que já produziu 1 bilhão de revistas vendidas em 126 países, além de cerca de 3 mil produtos licenciados. Mônica, a mais famosa personagem de Mauricio de Sousa, recebeu o título de embaixadora da Unicef no Brasil.


clique para ampliar

O que diz a lei
A interpretação

O Instituto Alana defende que, de acordo com a interpretação conjunta da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Código de Defesa do Consumidor (CDC), a legislação brasileira já proíbe qualquer tipo de publicidade dirigida às crianças. O artigo 37 do CDC, por exemplo, veta qualquer tipo de publicidade enganosa ou abusiva e repudia a mensagem publicitária que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança. “É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança e desrespeite valores ambientais. Ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança”, cita o texto.


Fonte: Correio Brasiliense

0 comentários: