janeiro 21, 2009

Homossexualismo e preconceito

A França e a Holanda propuseram ao Plenário das Nações Unidas (ONU) o fim da criminalização do homossexualismo em todas as nações – membros da entidade. Este fato me fez lembrar duas histórias, uma de Paris, na época do meu asilo político (1973-1980), outra em Jataí (1954-1956). Em certa ocasião, andando com um amigo francês, nos arredores da Avenue Fox, próximo da Place Etoile, vi-me diante de um belo edifício, impecável arquitetura parisiense. Admirado, perguntei a meu amigo:

– Jean Paul, que prédio é este?

Ele respondeu-me que era propriedade de um sheik árabe, um príncipe do petróleo muito rico. “Ele é homossexual. Como não pode exercer livremente sua sexualidade em seu país, mantém esse luxuoso local aqui em Paris.” Ali teria encontros de vários nobres e celebridades do meio artístico e de outras atividades. Realizava festas, enfim, o sheik patrocina um verdadeiro clube de ricos, chiques, homossexuais e personalidades de vários continentes.

De Jataí lembrei-me imediatamente do drama vivido por dois jovens adolescentes, contemporâneos meus, Duda e o Zezão (nomes fictícios), mas personagens reais. O Duda, filho de família de classe média – os pais eram pequenos empresários. O Zezão, negro, filho de empregada doméstica. Os dois homossexuais, reprimidos, discriminados, desrespeitados na sua identidade sexual e de cidadãos. O primeiro, para superar o preconceito, estudava muito, formou- se em Direito, saiu de Jataí, advogou em várias praças, sempre tentando superar a discriminação. Jamais assumiu livremente sua sexualidade, de sofrimento em sofrimento, na profissão e na vida sentimental. Terminou por suicidar-se em Goiânia com um tiro no coração.

Zezão, um tipo atlético, alto, exímio goleiro, passou por vários times da época. Valente e destemido, cheio de casos e atritos malresolvidos, discriminado, malvisto.

Jataí na época era uma pequena cidade ainda muito preconceituosa. Zezão terminou assassinado, numa briga mal explicada e nunca esclarecida. Mais uma vítima de paixões, amores e ódios malresolvidos no campo da opressão aos homossexuais.

Os preconceitos contra o lesbianismo possuem os mesmos matizes, religiosa e cultural. Historicamente, as mulheres homossexuais sofrem perseguições brutais em nome de valores travestidos dos bons costumes, da fé em Deus.

Tudo é válido para discriminar quem tem opção sexual diferente da convencionada como a única admitida pelas tradições conservadoras e religiosas das classes dominantes na maioria das sociedades constituídas. O machismo exagerado às vezes é um pouco mais permissivo com as lésbicas, preferindo dissimular o problema, preferindo o fingimento como se não fosse percebido, ao contrário do que acontece com o homossexualismo masculino.

Voltando a Paris e Jataí, os personagens das duas histórias tiveram finais diferentes. O nobre árabe homossexual seguramente continuou a frequentar a capital francesa. Gozando da relativa liberdade dentro da pluralidade metropolitana, mais tolerante e humanamente mais evoluída. Até na opção sexual, ser da classe dominante fica menos difícil para exercer sua sexualidade. Imagine se for pobre, preto, índio ou residir em um país onde a homossexualidade é crime, punido até com a pena de morte.

Os meus contemporâneos de infância jataienses tiveram um final trágico, morreram jovens, vítimas da violência intolerante, que recusa a aceitar os seres humanos com suas diferenças. Eles não eram doentes, tinham as mesmas aspirações de qualquer jovem: crescer, amar, contribuir para fazer um mundo menos injusto, poder exercer sua sexualidade sem temor. Como diz o meu amigo Leo Mendes, um belo dia a pessoa revela – se hétero ou homossexual, simplesmente humano, nem um caso e nem outro é doença. Não há remédios para ser, nem deixar de ser, a pessoa descobre. O importante, o verdadeiro humanismo é respeitá-la como ela é. A história registra importantíssimas contribuições de homossexuais em todos os campos das atividades humanas, artísticas, intelectuais, científicas e por ironia até religiosas e religiosos.

Para não perder o foco, quero registrar o meu espanto quando soube que 62 países, liderados pelo governo sírio, estão armando um poderoso grupo de resistência contra a proposta da França e da Holanda na ONU.

ONU já está esvaziada pela truculência hegemônica do governo Bush. Com certeza não votará tão cedo essa proposta, que se aprovada não terá condições de fazê-la ser cumprida pelas nações teocráticas e fundamentalistas. Contudo, a iniciativa franco-holandesa é um grande passo no sentido de amenizar a violência, a ignorância, a discriminação odienta como, infelizmente, ainda é tratada a questão humana referente ao homossexualismo, na maioria dos países filiada à ONU.

Para finalizar, qual é a posição oficial do Brasil sobre esta proposta tão relevante para a causa da democracia e do humanismo?


Tarzan de Castro é ex-deputado (estadual e federal), empresário, diretor da revista Hoje e articulista do Diário da Manhã

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