fevereiro 19, 2008

Prostituição Infantil

Num lugar da Bahia

Neide Durte

Quando conheci “Z”, logo pensei em lhe comprar um sonho, aquele doce recheado de creme. Ela me disse que, entre os doces, era o seu preferido. Menina magrinha, dez anos de idade, sainha curta, chinelinho de dedo, brincava de pular poça d’água, naquele calor da Bahia, na região da Costa do Dendê.

“Z” não sabe ler, nem escrever. Passa os dias circulando pela cidadezinha onde mora sendo assediada principalmente pelos caminhoneiros, que atravessam essas estradas.

“Z” não precisa de favores, ela mesma compra seus sonhos.
- Com que dinheiro?, eu pergunto.
- Fazendo ousadia, ela responde.

Às vezes lhe dão um real em troca do sexo; às vezes dois e, às vezes, até 50 centavos. Ela se dá por satisfeita: compra sonhos, suco de laranja. Só não gosta quando caminha pela praça e as outras crianças riem dela. Mas agora, quando começa a se formar em volta da sua cidade um lugar para turismo de luxo, muitas outras meninas, conhecidas de “Z”, vivem as mesmas experiências que ela.

Sexo oral, por um real.
Sexo real, por um real.

“Z” tomou 30 injeções de antibiótico para curar o cancro e a gonorréia. A moça do Conselho Tutelar acredita que ela esteja curada. “Z” fica alheia a essa conversa, como se a doença não fosse assunto dela, nem uma questão de crianças, mas de adultos.

A mãe de “Z” sabe de tudo e parece incentivar a filha nesse caminho. Para nós, finge não saber de nada e diz que não tem dinheiro para mandar a filha para a escola.

“Z” parece não entender direito o que está fazendo, como se tivesse aprendido que a vida é assim: para ter sonho e suco de laranja é preciso passar por aquilo: fazer sexo com homens feitos – ou malfeitos.

Uma coisa normal, que ela aprendeu a chamar de ousadia.


A prostituição infantil no Brasil é um problema social, político, ético que continua sem solução. Considerado o terceiro comércio mundial mais rentável, a prostituição infantil só fica atrás apenas da indústria de armas e do narcotráfico.

Por se tratar de uma atividade ilegal, tornou-se clandestina; e porque não é vista, não existe... para os olhos da população e do governo.

Acreditava-se (e alguns ainda acreditam) que a prostituição infantil era sustentada pelo turismo sexual, no qual estrangeiros viriam ao Brasil para se relacionar sexualmente com mulheres/meninas nas cidades litorâneas. No entanto, a realidade é outra: a maioria dos clientes são brasileiros de classe média/alta, casados e, algumas vezes, com filhos na mesma faixa etária dessas meninas. Motoristas de caminhão e de táxis, gerentes de hotéis e policiais também se encontram nesta lista.

Por outro lado, as meninas pertencem a classes menos favorecidas, sendo de famílias pobres e desassistidas pelo governo. Muitas não freqüentam a escola e perambulam pelas ruas sem ter outra ocupação que tentar sobreviver com a venda do sexo.

A violência doméstica, o abandono e a degradação familiar podem fazer parte da vida dessas crianças desde muito cedo.

Uma parcela das mães dessas meninas desconhece a atividade das filhas, mas nem sempre é assim. Muitas vezes são os próprios pais que conduzem as crianças para a prostituição: um trabalho lucrativo para a família.

Essas meninas prostituídas podem apresentar numerosos transtornos orgânicos (doenças sexualmente transmissíveis) e psíquicos, com atraso no desenvolvimento. É preciso lembrar que são vítimas inconseqüentes.

Assim como é preciso lembrar que há Leis que proíbem motéis e estabelecimentos similares a receber menores de 18 anos; Leis de proteção à criança... Leis que são esquecidas e nunca cumpridas.

Campanhas podem ser realizadas; discussões sobre os Direitos Humanos e contra a violência e prostituição infantil podem movimentar os meios acadêmicos; o Governo pode planejar programas assistenciais e destinar verbas... mas algo mais precisa ser feito.

Lugar de criança é na escola

Denuncie toda e qualquer situação de exploração infantil e exija que se cumpra os direitos das crianças!

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