janeiro 05, 2010

NOTA PÚBLICA

SOBRE A PRÁTICA DE TORTURA E TODAS AS FORMAS DE VIOLÊNCIA E TRATAMENTOS HUMILHANTES CONTRA ADOLESCENTES INTERNADOS NAS UNIDADES DO DEGASE/RJ


“Nenhum tipo de violência é justificável e todo tipo de violência é evitável”
(ONU, Estudo Mundial sobre Violência contra Crianças)

No dia 1º de janeiro, data em que se comemora o dia mundial da paz, o Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente - CEDECA – Rio de Janeiro manifesta publicamente seu REPÚDIO a prática de tortura, violência e tratamentos humilhantes nas unidades de internação do Departamento Geral de Ações Socioeducativas – DEGASE, do Estado do Rio de Janeiro amplamente denunciado às cortes internacionais de proteção aos direitos humanos e recentemente novos casos foram divulgados pelo Jornal “O Dia” de 21, 22, 23 e 24 de dezembro de 2009.

Para o CEDECA Rio de Janeiro, o respeito à vida é parte fundamental da luta pela consolidação da democracia e para que efetivamente o Estado do Rio de Janeiro possa dizer um “basta!” e um “nunca mais” a todas as formas de tortura, violência e tratamentos humilhantes contra adolescentes internados nas unidades do DEGASE/RJ e, acima de tudo identifique os responsáveis por crimes contra os direitos humanos e promova a reparação de pessoas que sofreram violações.

É fundamental que o Estado do Rio de Janeiro reconheça a tortura como um crime e se posicione contra a tolerância a essa prática. O combate a qualquer tipo de tortura e o respeito à vida são fundamentos da dignidade humana.

Há muitos anos as entidades de direitos humanos e de defesa dos direitos da criança e do adolescente vêm denunciando as inúmeras irregularidades que ocorrem nas unidades de internação da DEGASE do Rio de Janeiro. Entre os problemas evidenciados podemos destacar o total descumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a prática sistemática de tortura, entre outras formas de violência dentro da instituição.

Condições de superlotação e falta de higiene, estigmatização e discriminação por parte da sociedade e pessoal pouco capacitado aumentam o risco de violência contra adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação nas unidades do DEGASE. Esses adolescentes ficam expostos a violência por parte de pessoas e autoridades responsáveis por seu bem-estar.

Alguns casos são registrados nas Delegacias locais e apurados internamente pela Ouvidoria e Corregedoria daquele órgão, o que reduz o nível de imparcialidade na apuração dos fatos, já que funcionários do próprio DEGASE estarão apurando responsabilidades de seus colegas, comprometendo sua independência e autonomia, nem todos os agressores são responsabilizados por seus atos, a prática persiste, pois há uma certeza da impunidade e tolerância da violência contra os adolescentes.

A atuação do Estado na punição exemplar de práticas de tortura cometidas por agentes públicos é de grande relevância neste combate.

Cabe ressaltar o esforço de alguns funcionários do DEGASE no sentido de melhorar o atendimento dos adolescentes internados, e ainda o fato do DEGASE ter sido integrado a estrutura da Secretaria Estadual de Educação, no entanto tais iniciativas não vem surtindo resultados esperados principalmente em relação a violência.

Em novembro de 2008 o Governo do Estado editou o Decreto nº 41.553, cuja ementa informa o seguinte: “Autoriza o DEGASE a adquirir e utilizar equipamentos não letais, para contenção e segurança dos adolescentes em tratamento socioeducativos e dá outras providências”. No mesmo sentido é a decisão da realização de curso de defesa pessoal (arte marcial – karatê jutsu) para os agentes do DEGASE.

O uso do equipamento “não letal” foi garantido por liminar concedida pela 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça ao Governo do Estado.

Tais medidas demonstram claramente um distanciamento da idéia da socioeducação proposta pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, bem como a necessidade de um acompanhamento sistemático da sociedade civil e dos órgãos de proteção aos direitos humanos.

Fatos graves foram reiteradamente denunciados a organismos nacionais e internacionais de Proteção dos Direitos Humanos. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) que abriu um processo contra o Estado Brasileiro (caso 11.702).

As entidades da sociedade civil embora sejam impedidas de acompanhar os adolescentes internados e fiscalizar as condições em que se encontram as suas diversas unidades, nos últimos anos apresentaram várias propostas visando o reordenamento institucional, que perpassa pela regionalização do atendimento, com a criação de pequenas unidades, onde os internos possam ficar próximos de suas famílias e da comunidade, além da necessidade de um projeto pedagógico consistente.

A municipalização das medidas sócio educativas em meio aberto (Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade) também tem sido um dos caminhos apontados pelas entidades.

Infelizmente, o Governo do Estado do Rio de Janeiro tem insistido em ignorar toda a legislação internacional e nacional sobre o tema e todas essas propostas de efetivação dos direitos nelas previstos, mantendo uma política exclusivamente segregacionista em relação ao adolescente em conflito com a lei, reproduzindo o modelo carcerário de extremo confinamento e afastamento do núcleo familiar.

O processo sócio educativo não se desenvolve e a disciplina interna é mantida por meio de tortura e outras práticas escusas.

Assim, o Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDECA – RIO DE JANEIRO) cobra uma posição do governo brasileiro, em especial ao Governo do Estado do Rio de Janeiro, que sejam coerentes com os compromissos constitucionais com a proteção a dignidade da pessoa humana, com o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) e com os compromissos internacionais com a promoção e proteção dos direitos humanos, em especial a Convenção da Criança e do Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas e Degradantes. O momento é decisivo para que o país avance para uma institucionalidade democrática que efetivamente reconheça e torne os direitos humanos conteúdo substantivo da vida cotidiana de cada um/a dos/as brasileiros e brasileiras. Como organização da sociedade civil, o CEDECA – RIO DE JANEIRO está atento e envidará todos os esforços para que as conquistas democráticas avancem sem qualquer passo atrás.


CEDECA - Rio de Janeiro
Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
Avenida General Justo, 275 Sala 317/A - Bloco B – Castelo
20.021-130 - Rio de Janeiro – RJ
email: cedecarj@cedecarj.org.br
skype: cedeca.rj
Telefone: (55 21) 3091-4666

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