agosto 19, 2008

União civil entre homossexuais

Ação no Supremo

União civil entre homossexuais: representantes de ONGs estão otimistas, mas condenam resistência no Congresso

Publicada em 12/08/2008.
Ana Carolina Morett - O Globo Online

RIO - Enquanto projetos referentes a direitos dos homossexuais tramitam, sem avanços, no Congresso, representantes de ONGs do movimento GLBT (gays, lésbicas, bissexuais e travestis) depositam suas esperanças na ação impetrada no Supremo Tribunal Federal (STF) em março deste ano pelo governador do Rio, Sérgio Cabral, em defesa do reconhecimento da união entre casais homossexuais para efeito de benefícios como dependência em planos de saúde e Previdência Social.

Para Cláudio Nascimento, coordenador do Grupo Arco-Íris e superintendente da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos do Governo do Estado do Rio de Janeiro, do Rio, a ação que será votada neste semestre representa um avanço da luta dos homossexuais por igualdade dos direitos. Ele acredita que será favorável o parecer do relator do caso, ministro Carlos Ayres Britto, que aprovou a realização de pesquisas com células-tronco.

- O movimento GLBT já vem pedindo essa ação há muito tempo. Para nós, a expectativa é que o Supremo reconheça essa demanda por união civil, algo que o próprio poder Judiciário já vem reconhecendo. Nossa esperança é que essa matéria está na mão do ministro Ayres Britto, que deu parecer digno e progressista em relação às células-tronco. Espero que ele faça o mesmo com a união civil - afirma Nascimento.

Nascimento acredita que a falta de reconhecimento da união de casais com sexos diferentes coloca os homossexuais como "cidadãos de segunda classe" e provoca inúmeros problemas que cidadãos heterossexuais desconhecem. A morte do seu companheiro em decorrência da Aids, em 1994, é um exemplo. Depois de cinco anos de relacionamento, Nascimento acumulou cerca de R$ 70 mil em dívidas com medicamentos, e não teve direito aos benefícios normalmente conferidos a quem perde o companheiro. A família, no caso, recebeu os recursos.

" A gente constrói patrimônio, existe uma história afetiva, e não há nenhum mecanismo legal que proteja essas relações"

- Quando ele morreu, a família, que nunca participou, só queria se preocupar com o seguro e os benefícios. Fiquei com as dívidas, e os recursos, que poderiam me ajudar, ficaram com a família dele. São questões como essas que interferem no exercício pleno da cidadania. A gente constrói patrimônio, existe uma história afetiva, e não há nenhum mecanismo legal que proteja essas relações. Isso coloca os homossexuais como cidadãos de segunda classe - diz Nascimento.

Para Nascimento, a ação proposta por Cabral representa uma alternativa à luta pelo reconhecimento da união de casais do mesmo sexo no Congresso. Segundo ele, o Legislativo deixa de cumprir o papel de atuar para todos quando omite as necessidades dos homossexuais.

- O poder Legislativo não pode ficar omisso diante da discriminação diante dos homossexuais. É uma dívida histórica. É preciso que se aprove os projetos de lei que tramitam no Congresso. Se o Congresso não faz, pelo menos o governador do Rio assumiu a causa, entendendo que, na prática, o conceito de que todos são iguais não está sendo respeitado - diz.

" O poder Legislativo não pode ficar omisso diante da discriminação diante dos homossexuais. É uma dívida histórica " - Cláudio Nascimento

Alexandre Santos, presidente da Associação da Parada Gay de São Paulo, também condena a resistência do Congresso. Apesar de considerar a ação impetrada por Cabral um avanço, ele diz que o ideal no Brasil seria a aprovação de uma lei reconhecendo a união civil homossexual:

- Hoje, nosso maior inimigo no Congresso é a bancada religiosa. Nos direitos dos homossexuais, o Brasil ainda está atrasado em relação a outros países da América Latina. O ideal seria um projeto nacional, mas toda ação positiva em favor da população GLBT é bem-vida.

Vasco Pedro da Gama Filho, de 36 anos, e Dorival Pereira de Carvalho Júnior, de 45, estão juntos há 16 anos. Os dois trabalham como cabeleireiros em Catanduva, interior de São Paulo. Em 2004, eles adotaram Theodora, que hoje tem sete anos e foi a primeira criança do país a ter a dupla paternidade de um casal homossexual. Para Vasco, os projetos de lei no Congresso acabam não sendo votados por conta do preconceito de alguns parlamentares. Ainda assim ele tem esperança de avanços:

- Algumas empresas de plano de saúde e bancos já são favoráveis a benefícios aos casais homossexuais. Avançamos muito, mas o preconceito ainda é grande.
Segundo Vasco, caso um dos dois morresse, teria que fazer um acordo informal com os parentes do companheiro.

- Se o Júnior morresse, eu ficaria praticamente desamparado, dependendo da boa vontade da família dele.

Cláudio Nascimento destaca o trabalho de juízes que já reconhecem, em casos individuais, direitos de casais homossexuais que mantêm união estável. Além disso, ele considera a participação de heterossexuais nas passeatas organizadas pelo movimento a prova de que a sociedade também deseja a igualdade dos direitos.
O presidente do grupo Atobá, Paulo César Fernandes, que mantém uma relação de 25 anos, também é otimista:

- Acho que daqui a alguns anos as pessoas vão ficar apavoradas quando a gente contar que homossexuais e heterossexuais não tinham o mesmo direito, assim como há tempos atrás a mulher não podia votar.


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