Eyre Malena de Figueirêdo
Mônica Saemi Okabe
Tatiana Sotero
Trabalho elaborado por acadêmicas do 5º período de Psicologia da Faculdade Integrada Tiradentes – FITS, para obtenção de parte da nota da 1ª Unidade Programática na disciplina Ética em Psicologia, sob orientação do Profº Maurício Luiz Marinho de Melo.
Maceió – AL, 30 de setembro de 2009.
RESUMO
Este trabalho aborda questões acerca da prática da psicoterapia e sua relevância no âmbito da Psicologia, considerando a Resolução N.° 010/2000 do Conselho Federal de Psicologia, que dispõe sobre a especificidade e qualidade da psicoterapia enquanto prática profissional do psicólogo, com ênfase nas questões éticas existentes. Destaca-se também a imprescindível necessidade de discussão e produções de referência para esse campo de conhecimento, que desta forma, o Sistema de Conselhos de Psicologia elegeu o ano de 2009 para fomentar o debate sobre a Psicoterapia, que tem a dinâmica, a diversidade e a complexidade como marcas determinantes de sua existência, visando o aperfeiçoamento da atuação profissional, a melhor formação dos psicólogos nesta prática e a construção de referências para área.
Palavras-chaves: Psicoterapia; Ética; Profissão.
ABSTRACT
This paper addresses questions about the practice of psychotherapy and its relevance in psychology, considering the Resolution N.º 010/2000 of the Federal Council of Psychologists, which provides for the specificity and quality of psychotherapy practice as a psychologist, with emphasis on ethical ones. We also highlight the imperative need for discussion and production of reference for this field of knowledge, which in this way, the System Board of Psychology elected in 2009 to stimulate discussion about psychotherapy, which has the dynamics, diversity and complexity as determinants trademarks of their existence, seeking the improvement of professional performance, better training of psychologists in this practice and the construction of references to the area.
Keywords: Psychotherapy, Ethics, Profession.
Introdução
Este Artigo pretende discorrer sobre o desenvolvimento ético da atuação do psicólogo como psicoterapeuta, considerando que o ano de 2009 foi eleito pelo Sistema Conselhos de Psicologia para proporcionar o debate sobre a psicoterapia dentro da sua dinâmica, complexidade e diversidade.
Pretende-se proporcionar reflexões acerca da prática da psicoterapia, tendo em vista, ser um saber indispensável na formação e construção da identidade do psicólogo, gerando debates para estruturação e desenvolvimento da categoria.
Considerando que as psicoterapias se inscrevem no pólo clinico, embora não o esgotem, e que estão voltadas para o homem, podemos também considerar a idéia que as psicoterapias existentes possam ser incluídas num conjunto cientifico bem demarcado, como sugere Rodrigues (2009).
Neste contexto, elaborar questões sobre a ética nesta prática se faz necessário para complementar os construtos científicos da profissão que possuí sua regulamentação efetivada. Mas primeiramente, é preciso definir o real significado da Psicoterapia, prática esta de grande relevância para a Psicologia.
Psicoterapia como uma disciplina cientificaCampo em Negrito
A Resolução N.º 010/2000 do Conselho Federal de Psicologia, que especifica e qualifica a Psicoterapia como prática do Psicólogo diz que:
“Art. 1º – A Psicoterapia é prática do psicólogo por se constituir, técnica e conceitualmente, um processo científico de compreensão, análise e intervenção que se realiza através da aplicação sistematizada e controlada de métodos e técnicas psicológicas reconhecidos pela ciência, pela prática e pela ética profissional, promovendo a saúde mental e propiciando condições para o enfrentamento de conflitos e/ou transtornos psíquicos de indivíduos ou grupos.”
Entende-se por psicoterapia o espaço no qual o paciente vai em busca de recursos para lidar com as dificuldades que ele identifica em sua vida. De acordo com Ayres e Botelho (2009), a interação que se instala a partir dessa procura provoca uma troca entre parceiros, cliente e psicoterapeuta, caracterizando um espaço de reflexão. Esse lugar que se configura enquanto um dispositivo de transformação do sujeito transcende os muros das clínicas, dos consultórios e de outros serviços de atendimento psicoterápico. Logo, também deve ser encarado como uma práxis fundamental no campo da ação social, exigindo assim responsabilidade e ética da profissão.
Dentro da psicoterapia existem várias formações teóricas ou especialidades conhecidas como abordagens ou linhas de trabalho; cada psicólogo se especializa na abordagem com a qual mais se identifica. No entanto, Ludwig e cols. (2005) coloca que, independentemente das diferenças entre as múltiplas correntes teóricas que constituem o universo das psicoterapias, uma questão que nos parece que deva permear todas elas é a possibilidade de enxergar o homem a partir de uma visão integrada/sistêmica, onde o psíquico, o orgânico e o social, dada suas porosidades, se agenciam exercendo influência na construção desse indivíduo, assim como na configuração de suas problemáticas.
Quem atua em Psicoterapia?
Partindo do pressuposto existido pelas várias dimensões teóricas, Neubern (2009) mostra que a própria história da psicoterapia foi construída a partir de vários saberes que inicialmente não fazia parte do universo da Psicologia (já que ela estava mais ligada aos espaços acadêmicos para o reconhecimento científico), como a medicina, antropologia, filosofia. Contudo, o apelo da exclusividade tem uma base importante sobre a formação, já que a formação da Psicologia é bem diversificada e abrange outros saberes como a Antropologia, Sociologia, Filosofia, psicofarmacologia e neurociências sendo assim uma formação próxima das necessidades para atender as demandas da psicoterapia. Além disso, a formação de Psicologia tem duas práticas muito importantes que é o atendimento clínico e a supervisão, onde vivencia tanto questões do cotidiano e da subjetividade das pessoas como também desenvolve a habilidade técnicas proporcionando a articulação entre a teoria. Assim permitindo um diferencial a partir dessas práticas.
Segundo Silva (2005), a dificuldade de reconfiguração do campo está associada ao fato de ele não ser uma prerrogativa estritamente profissional dos psicólogos, pois temos outras companhias. Então, precisamos, junto aos outros profissionais que atualmente prestam esse tipo de serviço, estabelecer critérios públicos, transparentes - não critérios esotéricos - a cerca da prestação desse serviço.
Para essa discussão de exclusividade ou não da psicoterapia esse argumentos tem que ser bem aprofundados e tem que ser construído a partir do diálogo, partindo da complexidade que é a psicoterapia.
A ação do profissional de psicologia historicamente sempre teve como referencial na sua ação voltada aos acompanhamentos terapêuticos, tendo a psicoterapia como prática de muita relevância na atuação do psicólogo. Motivo pelo qual o tema vem possibilitar a esse profissional várias reflexões com objetivo de inquietar os profissionais a se mobilizar no intuito discutir, elaborar, dando um lugar desse profissional no campo da psicoterapia, tendo em vista por não tratar-se de uma ação específica do psicólogo.
Ética e a Psicoterapia
Segundo Ayres e Botelho (2009), Um código de ética profissional não se configura enquanto um instrumento normatizador de natureza técnica, mas enquanto um dispositivo de reflexão e orientação. Nesse sentido, Códigos de Ética expressam sempre uma concepção de homem e de sociedade que determina a direção das relações entre os indivíduos.
Calligaris (2004), discute bem sobre essa questão quando alega:
“Para ser um bom psicoterapeuta, é útil que a gente possua alguns traços de caráter ou de personalidade que, dito aqui entre nós, dificilmente podem ser adquiridos no decorrer da formação: melhor mesmo que eles estejam com você [conosco] desde o começo” (grifo do autor).
Ayres e Botelho (2009), alertam sobre as questões éticas no âmbito da clínica, um ponto relevante circunscreve-se à relação de escuta do terapeuta em relação paciente. Tal prática deve acolher a demanda sem julgamentos de ordens morais, religiosas, ideológicas, respeitando as diversidades da vida humana, não direcionando, nem mesmo estabelecendo promessas de cura no decorrer do processo de tratamento do indivíduo. Novamente, recorremos a Calligaris (2004) que completa:
“Você pode ser religioso, acreditar em Deus, numa revelação e mesmo numa Ordem do mundo. No entanto, se essa fé comportar para você uma noção do bem e do mal que lhe permite saber de antemão quais condutas humanas são louváveis e quais são condenáveis, por favor, abstenha-se: seu trabalho de psicoterapeuta será desastroso [além de passível de processo ético]” (grifo do autor).
Como medida de controle e definição dos procedimentos da ação do profissional de psicologia, em agosto de 2005, na Resolução do Conselho Federal de Psicologia N.º 010 de 2005 foi criado o Código de Ética da profissão de Psicologia como forma de um instrumento disciplinar e norteador menciona em seus artigos alguns procedimentos que acreditamos serem relevantes ao tema:
“Art.9 É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confiabilidade, a intimidade das pessoas, grupos, ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.” (Código de Ética)
“Art.10 Nas situações e que configure conflito entre as exigências decorrentes do disposto no art.9º e as afirmações dos princípios fundamentais desse Código, excetuando os casos previstos em lei, o psicólogo poderá decidir pela quebra do sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo.”
(Código de Ética)
De acordo com Ludwig e cols. (2005), o sigilo profissional é outro aspecto do qual não podemos nos descuidar, na forma de divulgação e troca de informações entre profissionais. Todos nós sabemos que é bastante comum e enriquecedora a apresentação/discussão de casos clínicos em supervisões, congressos bem como em publicações acadêmicas. Tal prática nos ajuda a pensar nossa atuação, a ressignificarmos nossos olhares. Entretanto, esse intercâmbio de experiências deve acontecer sob certos e rigorosos parâmetros éticos, pois estamos tratando com a delicada questão da intimidade pessoal. Lidamos com a vida de pessoas, suas histórias, seus medos. A invasão e o não consentimento dos envolvidos se configuram em falta ética, pois além de romper com as defesas do sujeito expondo-as ao mundo, publicizam sua vida, desrespeitando sua história pessoal, sua intimidade, o que resulta em uma quebra da confiança necessária à relação psicoterápica. Ruptura que, sem dúvida, traz efeitos negativos ao processo terapêutico.
Considerações Finais
Acredita-se que na psicoterapia deve haver reflexões acerca de cada dilema ético, considerando as suas particularidades, pois não existem verdades absolutas, mas existe a preocupação de que todo ser humano tenha o direito de receber o melhor tratamento disponível.
A existência de uma grande diversidade na demanda para psicoterapia, de fato, requer as várias abordagens teóricas que são trabalhadas ao longo do desenvolvimento da prática, já que somente uma visão não dará conta dessa diversidade de demanda, o que pode então contrapor com a luta dos psicólogos de que a psicoterapia se torne exclusiva.
Portanto, cabe aos profissionais de Psicologia firmarem a identidade de sua atuação para o alcance da credibilidade e de respaldo nos argumentos na discussão da exclusividade ou não da Psicoterapia. Neste caso, os princípios éticos são essenciais para a construção dessa identidade e da credibilidade profissional.
A Resolução N.º 010/2000 do Conselho Federal de Psicologia, aponta como um dos pontos de qualidade de atuação, a disponibilidade de uma cópia do Código de Ética do Psicólogo para a consulta do paciente/cliente para que o mesmo esteja ciente do contrato estabelecido e do pleno funcionamento dos serviços que estão sendo prestados.
Em todo esse contexto (de diversidade de demanda e de atuação) é notória a necessidade de criação de novas e específicas formas de avaliação, fiscalização e orientação ético-profissional para que se possa demarcar o que seja uma prática psicoterápica.
Muitas outras questões poderíamos aqui destacar, mas não pretendemos, nem mesmo conseguiríamos esgotar o assunto. Propusemo-nos apenas a disparar diálogos entre a ética e a psicoterapia.
Finalizamos esse debate, retomando e parafraseando Calligaris (2004) que nos apresenta uma singela, mas expressiva imagem do psicoterapeuta:
“... meu jovem amigo que pensa em ser terapeuta, se seus desejos são um pouco (ou mesmo muito) estranhos, se (graças à sua estranheza) você contempla com carinho e sem julgar (ou quase) a variedade das condutas humanas, se gosta da palavra e se não é animado pelo projeto de se tornar um notável de sua comunidade, amado e respeitado pela vida afora, então, bem-vindo ao clube: talvez a psicoterapia seja uma profissão possível para você.”
Referências Bibliográficas
AYRES, Lygia S. M.; BOTELHO, Maria C. Diálogos entre ética e a Psicoterapia. Rio de Janeiro, 2009.
CALLIGARIS, Contardo, Cartas a um jovem terapeuta: reflexões para psicoterapeutas, aspirantes e curiosos, Rio de Janeiro: Elsevier, 2004
CFP. Código de Ética do Psicólogo Disponível em : http://www.pol.org.br/pol/cms/pol/ resultadoBusca.jsp acesso em: 23/09/2009.
CFP. Resolução CFP Nº 010/2000 In.: _____ Profissão Psicólogo: Legislações e Resoluções para a prática profissional. Nº 02, 2007
CFP. Resolução CFP Nº 010/2005 In.: _____ Profissão Psicólogo: Legislações e Resoluções para a prática profissional. Nº 02, 2007.
LUDWIG, Martha W. B. e cols. Dilemas éticos em Psicologia: Psicoterapia e Pesquisa. Rev. Sociedade Bioética, Rio Grande do Sul, 2005.
SILVA, Marcus V. O.Transtornos mentais: construindo uma rede de cuidados. Palestra realizada em 2005, seminário na Saúde Suplementar.
RODRIGUES, Henrique J.Leal. Quem é Dono da Psicoterapia? Reflexões sobre a Complexidade, a Psicologia e a Interdisciplinaridade In: ______ Ano da Psicologia, Textos Geradores, Conselho Federal de Psicologia, Maio de 2009
FONTE: CRP-15
março 11, 2010
DILEMAS ÉTICOS EM PSICOLOGIA: A PSICOTERAPIA
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