novembro 29, 2007

No Jornal - virtude e terror


No Jornal Estado de São Paulo, Espaço Aberto saiu uma reportagem intitulada "Virtude e terror" de Miguel Reale Júnior .

Nesse artigo, o autor fala sobre a violência policial como uma constante na vida brasileira, lembrando que o filme Tropa de Elite, inspirado no Bope, batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro, reproduz essa triste realidade.

O autor faz uma breve retrospectiva dessa nossa história, citando o Serviço de Diligências Especiais, criado no Rio de Janeiro em fins da década de 1950 pelo chefe de Polícia, general Amaury Kruel, para combater bandidos, como o Cara de Cavalo.

Nos anos 60, criou-se um grupo de 12 membros, os Homens de Ouro, cuja missão era invadir barracos nos morros, eliminar assaltantes, em nome de uma sociedade que defendida o lema “bandido bom é bandido morto”. Nascia o Esquadrão da Morte.

Em São Paulo, o combate à criminalidade era empreendido também por um Esquadrão da Morte, liderado pelo delegado Sérgio Fleury.

Os grupos de extermínio do Rio de Janeiro e de São Paulo deram sua contribuição à ditadura no combate aos “subversivos”, com a prática de tortura entre quatro paredes e com o abate a tiros na rua. Estes policiais derivaram depois para a promoção e a proteção do jogo do bicho ou do tráfico de drogas, operando-se a transformação dos grupos policiais em organizações criminosas.

Charge do Glauco, Folha de SPauloNo enfrentamento à criminalidade em São Paulo, durante a ditadura, atuava a Rota, que ficou famosa pela indiscriminada prática de abusos contra inúmeros inocentes, pessoas sem passagem policial, mortos nas ruas sem prova de ter havido confronto. Todos esses atos de violência policial recebiam, no Rio e em São Paulo, apoio da população, especialmente da classe média, vítima desde a década de 70 do clima de medo.

O autor analisa que, com o fim da ditatura e o início de um processo de redemocratização, pouco se avançou no controle da violência policial, conclusão que tomou a partir das estatísticas de vítimas por homicídio pela polícia em São Paulo e no Rio - 20% - e a partir da constatação de que a violência espraia-se na sociedade, como produto da desorganização social e da omissão do Estado nas grandes cidades.

A vida está banalizada e, em nome da segurança, justifica-se o extermínio indiscriminado, pela polícia, de todos os que estão próximos ao inimigo a ser destruído. A famosa "bala perdida" é uma fatalidade necessária e a morte de um bandido é descrita como natural e, até mesmo, desejada. A polícia não tem que se explicar ou ser investigada se está "matando bandido", ou seja, cumprindo com sua função.

Não há regras para a violência.

Não se efetivam uma ampla diretriz de segurança pública e uma política criminal de cunho social. Resta apenas à sociedade a expectativa da ação salvadora de “heróis” truculentos capazes de acalmar o temor crescente.

Como se vê na figura do capitão Nascimento do filme Tropa de Elite, um dos incorruptíveis membros do Batalhão de Operações Especiais, o Bope do Rio, cuja retidão o legitima ao uso da violência mais brutal na luta contra o crime. Imbuído de santidade, o torturador afirma ser possível matar com eficiência e dignidade.

O autor conclui seu artigo, afirmando que estes são os ingredientes de uma ditadura ao estilo de Robespierre: virtude e terror. “A virtude sem a qual o terror é funesto; o terror sem o qual a virtude é impotente”.

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